O NOVO CENÁRIO PARA CONCESSIONÁRIAS DE AUTOMÓVEIS NO BRASIL

O NOVO CENÁRIO PARA CONCESSIONÁRIAS DE AUTOMÓVEIS NO BRASIL

O momento atual requer flexibilidade e disposição para se reinventar. Como percebo uma grande inquietação do setor quanto ao que está por vir e como contornar a crise, decidi reunir materiais e conhecimentos obtidos ao longo de minha trajetória profissional e acadêmica para contribuir para a superação deste cenário desafiador. Ao fim deste artigo, você entenderá que a crise atual apenas agravou o que já estava por vir. 

 

Economia Digital

            A forma como interagimos com a tecnologia mudou. Vivemos em uma economia dinâmica, com novos modelos de negócio e novos processos para atender um consumidor cada vez mais exigente e informado. Suas preferências e expectativas são influenciadas pela tecnologia, mais presente do que nunca na rotina de todos. A adaptação das empresas para esse cenário requer o posicionamento do cliente no centro das decisões da organização. Essa é uma transição de um modelo product centric, como era no passado, para customer centric – como já deveria ser hoje em todas as organizações que querem sobreviver a Economia Digital. 

A velocidade de adaptação das empresas aos novos cenários é um atributo chave para sua sobrevivência. De acordo com a Harvard Business Review, mais de 50% da Fortune 500 dos anos 2000 não faz mais parte dessa lista nos dias atuais devido à disrupção digital.


“A economia digital dos dias atuais é a menos piedosa da história”  - Bill McDermott, Former SAP CEO – The Path to Digital Innovation

 

Future of Automotive

            É comum encontrar em artigos e whitepapers sobre o setor o entendimento de que a que a indústria automotiva deve passar por uma transformação maior nos próximos 5 anos que nos últimos 50. Não é novidade que a transformação digital provocará grandes mudanças na indústria automotiva. A megatendência C.A.S.E (Connected, Autonomous, Shared and Electric) é um termo de uso cotidiano pelo C-Level das principais montadoras, que precisarão reinventar seu modelo de negócio para um consumidor com novas preferências. 

“Nunca tivemos um período tão grande de mudanças de modelos de negócios, de outras indústrias entrarem no negócio automobilístico. De pensar de forma diferente em outras receitas, porque se você não tem outras fontes de receitas vai desaparecer nos próximos 5 anos...” – Pablo Di Si, CEO Volkswagen América Latina em entrevista para Automotive Business.

            De fato, é possível observar um movimento das montadoras para se adequarem às novas exigências da Economia Digital. Os carros estão cada vez mais conectados, com evoluções notáveis a cada geração apresentada nos eventos de montadoras que participo através do Top Drive. Entretanto, a mesma atenção não tem sido dada ao processo de compra. 


O Processo de Compra

            A inovação na indústria ainda está muito focada em produto, com poucas alterações na forma de comprar carros em relação ao passado. Enquanto as inovações tecnológicas nos carros têm se mostrado disruptivas em termos de performance, segurança, eficiência e funcionalidade, as concessionárias mantiveram essencialmente o mesmo processo de venda nas últimas décadas. Esse entendimento também foi compartilhado no evento Planejamento Automotivo 2020 da Automotive Business, ao qual tive a oportunidade de participar em 2019. Além disso, em minha pesquisa com 1.185 compradores de carros no Brasil, pude constatar que há significativa insatisfação em relação a este processo. 

             Ainda que exista uma parcela de profissionais engajados na digitalização do atendimento e do showroom – inclusive possuo um relacionamento com diversos diretores de concessionárias que entendem tal necessidade de adaptação – não se observa uma disrupção geral no processo que atenda às novas expectativas dos compradores de carros. 

            A jornada de compra tornou-se consideravelmente complexa. O consumidor inicia a busca de seu automóvel no online. Até tomar sua decisão de compra, oscila entre o online e off-line, coletando informações sobre o veículo na internet e entrando em contato com diferentes concessionárias de uma mesma marca em busca de confiança sobre as propostas. Não há integração de suas informações, e é necessário repetir seu contexto e preferências para todos que participam do processo. A concessionária, na enorme maioria dos casos, não participa do início da jornada, ou seja, não está presente quando o consumidor inicia sua busca sobre o modelo desejado. 

 

Novo Cenário

            No estudo The Future of Car Sales is Omnichannel da Bain & Company, os partners da Bain’s Global Automotive practice apontam que os compradores de carros, condicionados pela Amazon e outras experiências online (com empresas adaptadas aos princípios da Economia Digital) cada vez mais esperam pela mesma qualidade de serviço e processo de atendimento que em qualquer outra experiência digital. Esse estudo entrevistou mais de 5.000 participantes em 5 países. 

“Montadoras e concessionárias precisarão de um entendimento profundo da natureza do comportamento de compra do consumidor para redefinir sua abordagem” – The Future of Car Sales is Omnichannel.

            É interessante notar que o entendimento sobre a urgência de uma adaptação das concessionárias a um novo consumidor já existe há mais de 2 anos. Ainda assim, era possível encontrar até o início deste ano profissionais céticos quanto à necessidade de repensar a jornada de compra. Com a pandemia, essa necessidade tornou-se inquestionável. 

            Cabe ressaltar também que a simples disponibilização de atendimento pelo What’s App está longe de representar uma adaptação ao novo cenário. De acordo com um estudo realizado pela Oxford Economics em parceria com o SAP Center for Business Insight que entrevistou 3.100 executivos de 17 países, fazer mudanças transformacionais, não apenas incrementais, é um dos fatores que distingue as organizações líderes das demais. É necessária a criação de um mindset digital em todos os níveis da organização, de forma a servir os clientes da maneira que eles querem ser servidos. 

 

Conclusão

            Faz-se necessário um maior entendimento das expectativas e preferências dos consumidores por parte das concessionárias para adaptar seus processos de venda às novas exigências do atual cenário. Além disso, estudos sobre concessionárias feitos por diferentes organizações renomadas convergem para a recomendação de estratégias omnichannel. 

“Como em qualquer indústria, a transição de um modelo tradicional para um modelo de vendas omnichannel requer mudanças significativas. Os líderes que abraçarem a mudança, encontrarem formas de inovar e investir em relacionamentos omnichannel com compradores de automóveis, terão uma vantagem competitiva duradoura.”- Future of Car Sales is OmniChannel – Bain & Company

“A indústria precisa de estratégias omni-channel para endereçar as mudanças nas exigências dos consumidores sobre como e onde comprarem suas carros”. Accenture – Digital Hits the Road”

 

Minha relação com o setor

            Em pouco mais de 3 anos trabalhando na SAP, pude aprender sobre a transformação digital, seja pelo fellowship na matriz na Alemanha – onde o impacto das tecnologias sobre negócios foi o principal tema com o qual estive envolvido – ou pela vibrante cultura de inovação que a empresa proporciona aos seus colaboradores. Em paralelo, com o crescimento do Top Drive (meu canal automotivo que trabalha diretamente com orientação para compradores de carros), meu interesse pelo setor automotivo tornou-se cada vez mais intenso nesses últimos 6 anos de experiência como apresentador do programa. Portanto, meu trabalho de conclusão do curso de Economia na UFRGS em 2019 foi justamente sobre a transformação digital na indústria automotiva, com foco em concessionárias e clientes finais. Desde então, buscar entender as tendências para o setor tornou-se meu grande hobby.